Autora: Carolina Lima (Técnica de Educação Especial)
A leitura é um processo cognitivo e linguístico extremamente complexo, que envolve o funcionamento dinâmico e a interação entre várias competências. A atenção, a memória, a percepção, a orientação temporal e espacial, o planeamento motor, a linguagem, as capacidades metalinguísticas e a cognição são áreas imprescindíveis quando abordamos o tema da leitura. No entanto, estas não devem ser consideradas condições obrigatórias para iniciar o processo de aprendizagem da leitura. Devem ser vistas como comportamentos estratégicos que podem ser trabalhados e desenvolvidos para valorizar o estilo de aprendizagem da leitura de cada criança e orientar os comportamentos estratégicos que deve ter.
Considerando as preferências e as competências de cada criança, podemos estabelecer metodologias de ensino da leitura, baseadas em três modelos: o ascendente, o descendente e o interativo. Neste artigo serão referenciados os modelos ascendentes e descendentes, pela diferença entre os princípios de cada um.
Nos modelos ascendentes, o método de aprendizagem da leitura respeita um conjunto de fases: é iniciado por processos cognitivos primários (juntar letras, combinar sílabas, originar palavras e unir frases, de acordo com as regras gramaticais) e evolui para processos cognitivos secundários (dar sentido às frases criadas).
Estes modelos têm como principais objetivos: o reconhecimento gráfico das letras, a associação entre as letras e os respetivos sons e o desenvolvimento da consciência fonológica – capacidade que consiste em discriminar, dividir e manipular, de forma consciente, os sons da fala – algo muito importante na aprendizagem da leitura e da escrita. Apresentam resultados positivos a longo prazo, já que preparam as crianças para ler palavras não familiares, que devem ser alvo de prática para se tornarem leitores fluentes.
Tendo em conta a essência dos métodos ascendentes, é possível afirmar que são adequados para crianças que apresentem uma boa identificação visual das letras, boa memória auditiva e que se encontrem numa fase inicial da aprendizagem da leitura, bem como para crianças que já tenham iniciado este processo de aprendizagem, mas que evidenciem dificuldades.
Os modelos descendentes pressupõem a aprendizagem da palavra como um todo e a associação direta da palavra com o seu significado. Para os defensores deste modelo as ideias do método descendente são progressistas e sensíveis, já que permitem o desenvolvimento da criatividade das crianças, uma vez que são elas que constroem, de forma ativa, o significado da mensagem e descobrem os processos implicados na leitura e na escrita. Assim, ler torna-se um jogo de adivinhas psicolinguísticas, em que o leitor utiliza o contexto e a informação prévia que tem do tema para antecipar e reconhecer as palavras.
À medida que o processo de reconhecimento das palavras é desenvolvido, são aprendidos os elementos menores, as sílabas e, finalmente, as letras. Assim, o leitor inicia o processo de leitura por processos cognitivos secundários e termina nos processos cognitivos primários.
Assim, é possível afirmar que os modelos descendentes são adequados para crianças com um vasto vocabulário, que estejam preparadas para compreender o significado da mensagem, que apresentem uma boa organização e planeamento e que produzam predições lexicais, semânticas e sintáticas com facilidade.
Em conclusão, a utilização de um método ou de outro depende de vários fatores que estão interligados e que vão definir a melhor estratégia a aplicar na aprendizagem da leitura e da escrita. Um modelo não se sobrepõe ao outro e podem ser usados em conjunto, quando as condições e os recursos são favoráveis para tal. O objetivo final dos modelos é o mesmo – obter significado da mensagem escrita -, ainda que de formas diferentes: no ascendente partimos da análise de letras, sílabas e palavras e no descendente partimos do contexto, da linguagem e da experiência de vida da criança.
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Carolina Lima
Técnica de Educação Especial