Autoras: Bárbara Ribeiro (Psicomotricista) e Mamie Brunk (Terapeuta Ocupacional)
Desde há muito tempo que temos como premissa que água é vida, o pequeno elemento químico H2O, está à nossa volta e dentro de nós. Todas as suas formas nos influenciam, e é assim que olhamos para a nossa intervenção em meio aquático, a água como ferramenta de trabalho, utilizando as suas propriedades em simultâneo com diferentes técnicas de intervenção, para melhorar a saúde e a qualidade de vida das nossas crianças.
A utilização da água com fins terapêuticos tem evoluído ao longo do tempo, recorrendo-se às propriedades físicas da água (temperatura e a pressão) para obter benefícios terapêuticos em Hidroterapia. Atualmente, com o intuito de utilizar este meio tão rico numa abordagem terapêutica, em Terapia Aquática combinam-se as propriedades mecânicas e térmicas da água, com técnicas e intervenções específicas, alcançando os objetivos terapêuticos propostos através de um trabalho colaborativo em equipa multidisciplinar.
A Hidroterapia é a abordagem que recorre às propriedades físicas da água (temperatura e pressão), para promover a reabilitação, o relaxamento muscular, a amplitude de movimento e o alívio da dor em disfunções ortopédicas, neurológicas ou respiratórias.
Na Terapia Aquática, surge a combinação das propriedades físicas e mecânicas da água, com técnicas de intervenção específicas para alcançar objetivos terapêuticos, definidos através de um trabalho colaborativo em equipa multidisciplinar.
Em contexto clínico na SalusLive – Centro Terapêutico, a terapia em meio aquático tem sempre como base a Hidroterapia, dado que as crianças já beneficiam pelo facto de estarem imersas na água, associando-se à Terapia Aquática devido às metodologias e técnicas específicas de intervenção, que se utilizam mediante os objetivos definidos em equipa multidisciplinar.
Em meio aquático, a terapia atua em quatro vertentes, nomeadamente:
- Terapêutica: utiliza as propriedades físicas e mecânicas da água e os efeitos biológicos da imersão nos diversos sistemas do corpo para o tratamento e recuperação, de forma a alcançar e manter um nível de funcionamento satisfatório em interação com o ambiente, promovendo assim uma melhor qualidade de vida;
- Educativa: as atividades propostas, vão de encontro ao contexto social da piscina promovendo as competências sociais e de interação, tendo em conta as exigências ambientais (às regras e conduta de boa higiene).
- Preventiva: concentra-se no desenvolvimento e manutenção de comportamentos promotores da saúde e da participação, bem como da preservação da atividade física. Além disso, atua na manutenção das habilidades, retardando o aparecimento de sintomas associados a determinados quadros clínicos.
- Lúdica/recreativa: que utiliza o brincar como ferramenta de motivação, por meio de atividades que proporcionam um ambiente lúdico, de recetividade, de descoberta e de curiosidade no meio aquático, tornando esta terapia mais agradável e divertida para as crianças.
A intervenção em meio aquático tem efeitos positivos no desenvolvimento das crianças (motor, cognitivo, sensorial e social), particularmente por ser um ambiente sensorial extremamente rico, estimulando todos os sistemas do corpo. Relativamente ao domínio da cognição, este contexto estimula a criatividade, afetividade, espontaneidade, comunicação e capacidade de resolução de problemas, isto porque, para além da água por si só aumentar a predisposição das crianças para as tarefas, estando estas mais motivadas e recetivas, utilizam-se estratégias, atividades e materiais que visam a promoção destas competências. Além disso, a nível motor promove o tónus muscular, do equilíbrio, da postura, do aumento das amplitudes de movimento, da resistência e capacidade respiratória, do esquema corporal e coordenação motora.
O efeito da pressão hidrostática fornece, de modo continuado, informação propriocetiva e tátil profunda, e resistência ao movimento, o que implica constantes ajustes posturais dentro de água que favorecem o controlo postural e o equilíbrio. Além disso, a integração destes sistemas, tátil e propriocetivo, promove a normalização do tónus muscular e favorece a reaprendizagem motora, melhorando assim, o planeamento motor e o esquema corporal.
Assim, a água, enquanto ambiente seguro e facilitador, permite que todas as crianças se movimentem e explorem o ambiente livremente sem sobrecarregar as suas articulações e músculos. Uma vez que na Terapia Aquática a água se encontra a uma temperatura ótima, cerca de 33/34 graus, que promove o alívio da dor, aumento das amplitudes de movimento e relaxamento muscular. (Dubois, 2011).
Além disso, a pressão hidrostática interfere diretamente no sistema pulmonar pela imersão ao nível, especificamente pela compressão das paredes do tórax, aumentando o fluxo sanguíneo para a cavidade torácica que levará a um aumento do trabalho respiratório e consequentemente, resistência pulmonar.
No meio aquático a deslocação é facilitada pela resistência da água, pois esta propriedade permite uma maior preparação da execução motora, dado que o movimento neste meio é mais lento. Desta forma, promove-se a coordenação motora, pois os movimentos bilaterais dos dois lados do corpo realizam-se de forma mais eficiente.
Assim, é comum que a população alvo seja heterogénea, pela diversidade de benefícios que este meio apresenta para qualquer bebé ou criança com alterações no seu desenvolvimento, independentemente de ter, ou não, um diagnóstico definitivo. Assim, de crianças com condições neurológicas, perturbações do neurodesenvolvimento, doenças neuromusculares, atraso do desenvolvimento, síndromes, entre outras.
Contudo, existem algumas situações e quadros de saúde nos quais a Terapia Aquática é contraindicada, tais como processos infecciosos ou febris, doenças infectocontagiosas, feridas abertas ou em processo de cicatrização, doenças reumáticas, problemas cardíacos e respiratórios graves, insuficiência renal grave, hipo ou hipertensão graves, alteração grave de termorregulação e epilepsia não controlada. No entanto, o meio aquático é um ambiente que estimula todos os sistemas do corpo, e apesar das contra-indicações, em alguns quadros clínicos aplicam-se determinadas medidas extra de segurança e cuidados específicos de forma que todas as crianças possam retirar o máximo potencial deste contexto.
Vamos mergulhar?
Bárbara Ribeiro – Psicomotricista
Mamie Brunk – Terapeuta Ocupacional
Referências Bibliográficas
Dubois, M. (2011). Aquatic Therapy for Children with an Autism Spectrum Disorder: Occupational Therapist Perspectives. UniversityofPugetSound
Fernandes, J. & Gutierres Filho, P (2015). Atualidades da Prática Psicomotora.Wak Editora.
Ferreira, A. (2019). Terapia Aquática- indicações, métodos e estratégias.Papa-Letras.
Gutierres Filho, P. (2003). A Psicomotricidade Relacional em Meio Aquático.Editora Manole.